Com transmissão ao vivo, imagens realistas e até direção de prova, corridas virtuais roubam a cena durante a pandemia.
Nesse período de pandemia, o automobilismo virtual acabou entrando de vez nas conversas entre apaixonados pelo esporte a motor em todos os cantos do mundo. Gente que nem conhecia ou não dava bola agora conta os minutos para ver as corridas virtuais da F1, da Indy e de tantas outras.
Essa vertente do mundo das corridas era vista apenas como diversão até a década de 2000, quando os jogos não tinham o realismo físico e gráfico tão apurado – quem chegava mais perto disso era a série Grand Prix, de Geoff Crammond (clique aqui para relembrar). Antes de seguirmos, mate a saudade desses games mais antigos no vídeo abaixo, que mostra a evolução dos games de F1 com o tempo.
Na década de 2010, surgiram as grandes e definitivas evoluções que criaram a base do crescimento disso tudo. A começar pelos volantes, que passaram a reproduzir exatamente todas as sensações de pneus e asfalto por meio de um motor acoplado na base da estrutura por onde ele é fixado em cockpits – que também foram criados, evoluídos e alguns até mexem! Os pedais também foram ganhando mais realismo, com níveis de pressão individuais. Veja abaixo uma demonstração desses cockpits de última geração, que chegam a custar 40 mil dólares.
https://www.youtube.com/watch?v=S1fW59hGVn8
Tecnologicamente, a evolução dos processadores e placas de vídeo dos computadores permitiu o desenvolvimento dos primeiros simuladores. O pioneiro foi o rFactor, em 2007, que, ao ser uma plataforma aberta e permitir a inclusão de carros e pistas feitas pelos jogadores, causou uma revolução neste meio. E, a partir de então, várias plataformas foram surgidas até os dias de hoje, onde as principais são o rFactor 2, o iRacing (mais focado nas competições dos EUA), o Assetto Corsa e o brasileiro Automobilista 2, desenvolvido pela Reiza Studios. Confira abaixo o nível de realismo do Automobilista 2, lançado neste ano.
Tudo isso junto fez com que o automobilismo virtual se tornasse uma parte importante dos treinos dos pilotos. Todas as equipes de F1 têm seu simulador e pilotos dedicados a eles, uma vez que os simuladores permitem fazer ajustes precisos que podem ser transferidos para o carro real. Os pilotos da Stock Car, por exemplo, se beneficiam da série Automobilista, que traz os carros e pistas da categoria, para treinar exaustivamente antes das etapas de verdade – e, com isso, os estreantes já chegam sabendo para que lado virar, que marcha usar e como dosar o pé em determinadas curvas.
Por fim, com a evolução da banda larga e das conexões de fibra ótica, não demorou muito para as competições virtuais começarem a “pegar” entre os apaixonados. A possibilidade de se competir pelos videogames em jogos como Gran Turismo, Forza e Project Cars com o mesmo tipo de equipamento também só aumentou essa febre, que resultou já na evolução de pilotos virtuais ao mundo real – melhor exemplo é o inglês Jann Mardenborough, que superou 90 mil concorrentes em uma competição de Gran Turismo, foi premiado com uma chance de disputar as 24 Horas de Dubai pela Nissan e iniciou uma carreira com passagens pela F3, GP3, culminando no Super GT japonês, onde compete atualmente. No vídeo abaixo, Rubens Barrichello fala um pouco sobre o automobilismo virtual.
A coisa ficou tão séria de uns anos para cá que quando a gente conta tem gente que não acredita: as corridas virtuais têm direção de prova, comissariado, briefing e punições! Sem contar as “promotoras”, que são as ligas que organizam tudo, inclusive as transmissões ao vivo com narração e comentários. No campeonato virtual da Turismo Nacional, a própria CBA está envolvida, colocando seus membros para participar.
Com isso, podemos dizer que o Automobilismo Virtual estava no lugar certo e na hora certa para assumir um protagonismo merecido, mas com magnitude jamais imaginada. Afinal, sem campeonatos, o que os pilotos estão fazendo? Disputando corridas virtuais. Isso chamou a atenção não só do fã de automobilismo, carente de competições, como o de grandes campeonatos e emissoras de TV – afinal, qual outro esporte pode fazer competições virtuais tão realistas com os próprios personagens participando? Nenhum. Não dá para fazer um jogo de futebol virtual com todos os jogadores.
A F1 criou a série Esports Virtual Grand Prix, que usa como base seu game oficial e tem a participação mista de pilotos oficiais – não todos, pois muitos não consideram a dirigibilidade o jogo tão realista assim – e celebridades. Geralmente, é protagonizada pelo trio Charles Leclerc, George Russell e Alexander Albon, que travaram disputas realmente interessantes. A Fórmula E trilhou o mesmo caminho. Usando o Gran Turismo Sport, do Playstation, e com apoio da Motul, até o Rally dos Sertões está com uma edição virtual. A prova será disputada em circuitos offroad do game (Sardegna – Moinhos de Ventos Colorado Springs e Fishermans Ranc), com a final acontecendo no dia 30/5.
A NASCAR e a Indy também fizeram corridas transmitidas pela TV e pela internet utilizando a plataforma iRacing, que é considerada a melhor de todas no que diz respeito a automobilismo norte-americano. Ambas geraram polêmicas: na NASCAR, Kyle Larson proferiu uma ofensa racista quando configurava seu equipamento ao vivo, foi demitido de sua equipe real e perdeu seus patrocinadores; já na Indy, uma batida deliberada de Simon Pagenaud em Lando Norris levantou um questionamento sobre ética no automobilismo virtual (o vídeo abaixo mostra em detalhes).
Aqui no Brasil, a Porsche Cup e o Turismo Nacional já inauguraram seus campeonatos. Enquanto a Porsche reúne mais estrelas, a Turismo Nacional conseguiu juntar os principais da turma que costuma correr nos seus regionais por ter como uma de duas premiações a chance de correr uma prova de verdade na Copa HB20. A Stock Car fará o seu campeonato em junho, utilizando a mais nova versão do Automobilista 2, aclamada pela crítica especializada, e os novos carros que a categoria pretende estrear em 2020. Todos em parceria com as principais ligas do automobilismo virtual, com direção de prova, transmissão e tudo o que existe à disposição. Isso sem contar as seletivas que algumas equipes estão fazendo e os desafios virtuais com carros de F3 e presença de grandes pilotos. Até a turma do Ultimate Drift entrou na brincadeira de competições virtuais.
Se você procurar pelo YouTube ou rodar pelas páginas de automobilismo nas redes sociais, vai sempre acabar se deparando com alguma corrida ao vivo – principalmente no período da noite ou aos finais de semana. Claro que isso não mata a sensação de ouvir um motor roncar, de sentir o cheiro da gasolina ou de ver um carro passando a 200 km/h na sua frente, mas é inegável que o automobilismo virtual virou uma alternativa real (desculpe o trocadilho) e veio para ficar.