Nosso editor Bruno Vicaria destaca como a renovação do GP do Brasil de F1 (ou GP de São Paulo) é tão importante para o futuro do esporte.
Ou melhor: estamos salvos por mais cinco anos, podendo aumentar para dez, se der tudo certo.
Não é segredo nenhum que a sobrevivência do automobilismo nacional de alto nível do Autódromo de Interlagos estão em boa parte ligados ao GP do Brasil de Fórmula 1. Sem GP, Interlagos seria presa fácil para aqueles interessados no valioso terreno, que pode render muitos condomínios. Basta sucateá-lo a ponto de torná-lo inutilizável, como foi feito com Rio e Brasília.
Sem Interlagos, a principal praça mercadologica para todos os eventos nacionais como Stock Car, Copa Truck, Porsche Cup, Copa Shell HB20 e Imperio Endurance Brasil, nenhum desses campeonato conseguiria sobreviver. Afinal, outras pistas vivem na corda bamba: Curitiba, Goiânia. E a história de Jacarepaguá é um bom exemplo disso.
Se vai se chamar GP do Brasil, GP de São Paulo, GP de Interlagos, GP da Prefeitura, tanto faz, o importante é acontecer. É o principal acontecimento no turismo de São Paulo, o que traz mais investimentos para a economia, o comércio, o setor hoteleiro. Mais até que o Carnaval, provavelmente, pela magnitude e valores envolvidos.
Outra coisa importante é que evitamos novamente virar chacota internacional. Depois do que aconteceu as duas últimas vezes com o WEC, onde passamos vergonha, tudo o que a gente não precisava era de uma empresa como a Rio Motorsports, que fez tudo errado e mais um pouco. Se comprometeu com a Dorna, promotora da MotoGP, não cumpriu; depois, com a Liberty Media, que também não correspondeu. Se cavarmos mais fundo tem também o fiasco da Indy em Brasília no ano de 2014. Com isso, só temos a F1 e olhe lá.
Por sorte (e talvez uma dose de juízo), a Liberty viu que estava sendo envolvida no meio de um jogo sujo político onde quem iria se queimar era ela, após descobrir que a empresa que ela estava confiando não é respeitada e nem credibilizada pelos próprios brasileiros e pessoas envolvidas no dia-a-dia do automobilismo. E a Globo, esperta que é, jogou direitinho: sabendo que não existe ninguém com competência similar, deu boa sorte para a Liberty e deixou o telefone dela caso ela mudasse de opinião, como disse o Flavio Gomes em seu blog. No fim, o telefone tocou. E ela sabia que tocaria.
Outro pano de fundo também é a briga com os organizadores que cuidam da prova há 30 anos, que são da turma do Bernie Ecclestone, algo que eles também tinham interesse em trocar, mas também viram que não há ninguém mais competente para tocar isso – essa turma ja ganhou o prêmio de GP mais bem-organizado há muito tempo. Lembrando que o Brasil não paga taxa para receber a prova.
Ou seja, era uma enorme teia de interesses isso tudo. E quem ia se ferrar era o esporte.
Afinal, estava nítida a intenção da Rio Motorsports em ser instrumento de uma guerra política e de egos entre Governo Federal e TV Globo. A Globo, parceira do evento, maior emissora do Brasil e única com alcance 100% no território nacional, por mais que tenha diminuído o tempo de cobertura na TV, passando clasificação e pós-corrida para seus parceiros SporTV e Globo Esporte, é a única emissora NO MUNDO a passar quase 90% do campeonato ao vivo pela TV aberta e SEM INTERVALOS durante.
Para se terem uma ideia, na Inglaterra, o berço da F1, apenas metade da temporada passa na TV aberta e com intervalos. E diversos outros países com relevância no grid nem transmissão gratuita tem. Enquanto isso, aqui o povo reclama de barriga cheia: do narrador, da emissora, da transmissão, de tudo, sem ter ideia da sorte que nós temos em relação a muitos outros países. Inclusive, somos a maior audiência do mundo da Fórmula 1. E de quebra com tudo isso poderemos ter 100% de acesso à F1TV.
Mas reclamar hoje em dia é que nem mato, principalmente nas redes sociais.
Quem vive do esporte, seja ele mecânico, dono de equipe, engenheiro, jornalista e muitos pilotos, na verdade, agradecem.
PS: sem querer defender a Globo, mas reconhecendo a influência dela, vamos fazer um exercício de reflexão: não fosse a Globo ter abraçado nos tempos de ouro, bancado o GP do Brasil desde seu primeiro ano e até antes dele acontecer, realizando as corridas teste de F3 e F2 europeias em 1971, e continuando a exibir a temporada, mesmo sem brasileiros, o Senna teria a mesma relevância do Helio Castroneves – um puta cara, puta piloto e só. Imagine se a Indy fosse da Globo e a F1 das Band nesses últimos 40 e tantos anos. Se ela tem na F1 seu produto com maior retorno financeiro de investidores, isso é mérito exclusivo dela.
E, sim, o fato de não ter piloto na F1 e a emissora ser, acima de tudo, um negócio, não exibir a classificação não é nenhum crime (visto que isso só começou a acontecer em 1991). E ela ainda disponibiliza o pré e o pós corrida sem custos pelo Globo Esporte. Quem gosta de corrida e se interessa, tem em mãos uma cobertura de corrida que não acontecia nem nos tempos de Senna, Barrichello e Massa, quando só entravam no ar dez minutos antes da largada. Se formos ver, não ter o pódio na TV e, em contra partida, ter pré e pós-hora da corrida disponíveis mesmo que pela internet, seguimos no lucro. E ainda podemos rever todas as provas no Globoplay.
O automobilismo que tanto amamos só tem ainda a relevância que tem por conta da sacada da Globo em apostar e investir nesse mercado. Senão seríamos o nicho do nicho, como são a maioria dos esportes fora o futebol. Talvez o que ela poderia fazer era criar alguma forma de fomentar a base e as categorias de acesso, seja pela internet, seja durante as transmissões, pois é de lá que saem os nossos talentos, que na maioria das vezes se bancam sozinhos e só são descobertos pelo grande público quando estão na porta da F1. Afinal, quando o cara está na F1, é um produto do Brasil, mas até ele chegar lá, ninguém geralmente faz nada para ajudar. Quer melhor exemplo disso: Felipe Drugovich, que muita gente só cresceu o olho após vê-lo impressionar na F2 este ano. Mas pergunta pra ele se alguém resolveu patrociná-lo desde então?
Resumindo: tem muita gente reclamando de barriga muito cheia nesse quesito. E, tão importante quanto a F1, é a pessoa que se diz apaixonada por automobilismo fomentar, comparecer e apoiar categorias nacionais e de base, do kart à Stock Car.