Tricampeão tem novo capítulo em sua coleção de polêmicas ao cutucar Globo ao vivo na Band, mostrando não se preocupar com o julgamento de ninguém.
Além da estreia da temporada 2021 da Fórmula 1, outro assunto que colocou a Band bastante em evidência no domingo foi a participação do tricampeão Nelson Piquet no programa Show do Esporte.
A participação foi bastante acima da média para os padrões históricos de Nelson Piquet, o anti-herói do esporte brasileiro. Costumeiramente arredio com assédio de público e imprensa, “Nelsão” estava mais que à vontade. Isso que esta deve ter sido a primeira vez na vida dele que ele passa tanto tempo ao vivo na TV e na companhia do filho Nelsinho.
O mote da aparição, além do aquecimento para a transmissão da corrida, foi uma jogada de marketing para apresentar a nova empreitada da família nas pistas, a equipe MX Piquet Sports na Stock Car, que terá o filho Nelson Piquet Jr. e Sérgio Jimenez. Detalhe: para isso acontecer, Nelsão teria de participar. E não foi uma negociata fácil.
A jogada foi muito bem-feita, com direito a ele entrar no estúdio pilotando o carro (não ficou muito claro se era ele, mesmo, pois não o mostrou saindo do carro) e um vídeo de Nelsão fazendo o shakedown do Toyota Corolla do filho com seu tradicional capacete branco e vermelho, andando depois de muito tempo em um carro de competição – a última memória que vem à cabeça é a exibição com o Brabham do primeiro título em 2011. Ou seja, há dez anos.
O que era para ser uma exibição de gala, no entanto, foi completamente ofuscada por uma nítida provocação ao Nelson Piquet comentar que a “F1 largou a Globolixo (sic)”, ao se referir à Globo, como fazem milhares de pessoas (anônimas ou não) todos os dias na internet. Curiosamente, ele tem lá seus motivos para criticar a Globo, algo que já é clássico dele. É notório o fato de que ele tem uma mágoa por não ter recebido suporte da emissora em nenhum momento antes da F1 e até durante, mas viu isso acontecer com Ayrton Senna antes mesmo de ele estrear na F1 – depois de morrer, então, nem se fala. Ou seja, nada novo. Ou melhor, uma jogada em cima da jogada.
Se você não viu (o que acho difícil) ou se você quiser rever, a íntegra está abaixo:
Quem pagou a conta foi a Band, que não tinha nada a ver com isso (mas estava ciente que, ao ter ele no programa, tudo poderia acontecer), passou ao vivo e depois soltou um comunicado elogiando a concorrente e dizendo que as opiniões dos convidados não representam a da emissora – apesar de ela mesmo ter lá dado suas cutucadas, mas não citando nomimalmente o canal carioca.
Como esperado, a frase reverberou forte na internet polarizada, uma vez que o termo #globolixo é trending topic o tempo todo – e não só na política, mas entre os fãs carentes das grandes coberturas de F1 do passado. Foi uma grande mistura de gente que nem sabe quem ele é e o que ele fez, mas comemorou o fato de ele ter usado o termo com toda a legião de haters cultivada por ele nos últimos 40 anos que aproveitou a oportunidade para destilar todo seu ódio (que incluem também quase todos os que tem Ayrton Senna como herói – parte dela nem nascida quando Nelson Piquet já calçava dois números diferentes de tênis por conta da panca de Indianápolis).
Essa postura dele de opiniões fortes e piadas ácidas, sem se preocupar com o que pensam ou se encaixar no padrão de “bom moço” nunca foi novidade e acontece há pelo menos 40 anos. Quem nunca ouviu ou leu em algum lugar um comentário “Piquet sendo Piquet”?
Episódios não faltam, como a provocação armada sobre a sexualidade de Ayrton Senna no fim dos anos 80, ou a tortura psicológica em Nigel Mansell, falando até da beleza da esposa dele. Ele se faz polêmico até de forma indireta como em 2006, durante a premiação do Capacete de Ouro, quando seu filho Pedro Piquet, então uma criança, contou que o pai só falava palavrão quando aparecia o Lula na televisão. Porém, aquelas não eram épocas tão polarizadas ou politicamente corretas como hoje. Mesmo assim, ele não se importa muito se precisar causar. E todas as opiniões que ele deu, foi porque alguém as pediu, pois ele não se expõe quase.
Piquet foi muito sagaz e inteligente ao pegar uma gíria política em alta, aplicar em sua relação pessoal com a emissora e, com uma palavra, misturar tudo o que for possível de se extrair dessa gíria em um grande caldeirão fervente, sabendo do impacto que isso ia gerar em um todo: da urticária que ia causar na sua legião de haters e da euforia nos haters da Globo. Chegou pronto para falar e, na primeira oportunidade, soltou. Isso não é um elogio, é uma percepção.
Foi lá, ajudou a nova equipe a expor seus patrocinadores com uma bela exposição de marca, andou num Stockão, deu risada e voltou para a vida normal em o seu paraíso particular em Brasília, administrando sua oficina, seus negócios e seus milhões, enquanto todo mundo ficou reverberando, xingando e problematizando o nome dele a semana toda na internet.
Autossustentável por conta de seus negócios de sucesso e descompromissado há muitos anos (como o vídeo acima prova), Nelson Piquet não precisa de patrocínio nem aceitação – está pouco se lixando para quem não paga suas contas (resumindo, todo mundo) ou se é mal-educado com jornalistas ou tietes. Perto de virar um setentão, então, ele não está nem aí para o julgamento alheio, o que é muito autêntico e raro neste mundo de cancelamentos, chegando a ser admirável. Piquet sendo Piquet.